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- Vou te contar um segredo, não conta para ninguém?

- Claro que não.

- Estou gostando de alguém.

- De quem?

- Segredo nosso?

- Prometo!

- Eu gosto do Nelsão.

A menina tinha seis anos. Nelsão, quarenta.

Era o motorista da família.

Apareceu assim que o crime foi confessado.

- Nelsão, ela gosta de você!

Anestesiada de tanta vergonha,

se escondeu embaixo da cama da avó.

Quando a avó a achou, já era noite.

A menina contou seu tormento.

A avó não era disso, mas soltou um riso frouxo.

A menina secou as lágrimas na risada e foi encarar o mundo.

Quem sabe conquistaria o Nelsão?

A empregada baiana era quem matava as galinhas.

A menina a seguia.

"Tá aqui por que? Dó faz o bicho demorar a morrer;"

A galinha sem cabeça corria ensanguentada.

A menina sentia-se culpada pela dança macabra,

mas não conseguia se afastar.

Melhor era parar de sentir dó.

Pediu a baiana que lhe ensinasse aquela destreza.

Os frangos eram colocados entre a perna e

puxava-se a cabeça até desgrudar do corpo.

As aves mais velhas, de carne mais dura,

era preciso usar uma faca para decepar.

A menina e a empregada baiana se divertiam

correndo para pegar as galinhas no quintal.

Enfiavam na panela de água fervendo

e depois depenavam o bicho.

A menina passou a comer pé, fígado, moela.

Dizia que não sentia mais dó, sentia respeito.

O rito a aproximava de Deus.

Minha tia tinha uma academia de ginástica que ficava encostada na casa da minha

avó. Nos finais de semanas a academia fechava. Sábado era o dia da faxina.

Paulo era o nome do faxineiro, um mulato quase gordo que tinha pouco mais de vinte

anos. Em um desses sábados, pulei o portão da casa da vovó e fui acompanhar a

faxina. Estávamos na sala de ginástica, cercados de espelhos quando, passando um

pano úmido no chão, o Paulo pediu para ver minha xoxota. Achei aquilo tão

engraçado. Ninguém nunca me pedira para ver minha xoxota. O que teria ela para

que o Paulo quisesse vê-la? Ele repetia a pergunta com sofreguidão.

Fiquei na dúvida do que fazer: ser uma garota boazinha e fazer o que ele me pedia ou

maltratar um pouco aquele homem grande e dizer não para ao seu apelo? Disse então

que minha xoxota não mostraria.

Ele insistiu uma vez, duas, dez. Passou a tarde limpando o chão e implorando. Eu não

saía do seu lado, mas não lhe mostrava o que queria.

Fui percebendo que com minha xoxota conseguia fazer que um homem forte e gordo

como o Paulo se curva diante de mim, uma criança de sete anos. Não sabia bem o que

ele queria, mas sabia que eu estava no comando agora.

Ficamos horas nessa dança, até que eu me cansar e ir embora.

Descobri nesse dia que, mesmo os homens sendo mais fortes, eu tinha uma arma

capaz de vencê-los.

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