A minha brincadeira favorita e de meus coleguinhas no maternal era um jogo que nós
mesmos inventamos. Chamava-se Pega-beijo. Os meninos corriam atrás das meninas,
se alcançassem uma delas, essa deveria dar-lhes um beijos fugaz na boca. Selinho, era
o nome desse beijo.
Um dia, eu corria apelo parque, mas nenhum menino corria atrás de mim. Quando
passou por mim, assustada e rápida, a Camilinha. Era a queridinha da turma e filha da
diretora, a temida Tia Lídia. Atrás dela, vinham o Bruno e o Rafael, os meninos mais
bonitos da turma. Nem repararam em mim; eu, que parada, era uma presa tão fácil.
Segui-os e vi quando, detrás da casa de bonecas, cercaram a Camilinha. Ela teria
que beijá-los. Fiquei indignada: os meninos mais bonitos da turma querendo uma
única menina e ninguém atrás de mim? À medida que os meninos de aproximavam
do beijo, a indignação fora se transformando no mais profundo sentimento de
rejeição. Não sofreria aquilo sem lutar pelos meus direitos. Antes que a beijassem,
disse:
- A tia Marilda quer falar com você e com você – disse apontando para os dois
bonitinhos.
- Mentira!
- Ah é? Mentira? Então tá. Ela tá muito brava, depois não diz que eu não avisei.
Eles pensaram por um minuto naquela chantagem. O Rafael concluiu:
- Se for mentira, a gente vai bater em você.
Soltaram a Camilinha e foram procurar a Tia Marilda. A menina me agradeceu toda
aliviada - a boba tinha certeza que eu fizera aquilo por ela! – e partiu.
Fiquei ali parada, esperando a minha sentença.
Logo eles voltaram. Estavam raivosos, me bateram sem dó. Não reclamei. Apesar
da dor, agora era notada.
Meu joelho sangrando era a prova de que agora era mais deles do que qualquer
Camilinha.
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